Manejo agroecológico fortalece produção animal sustentável em territórios indígenas no Paraná

Foto Leticia

Oficinas e visitas oferecem suporte técnico às comunidades Guarani, auxiliando no bem estar dos animais nas áreas indígenas

Por Assessoria FLD

Fotos: Ana Paula Soukef e Fábio Conterno

Por meio de oficinas e visitas técnicas, o projeto OPANÁ: Chão Indígena, desenvolvido pela Fundação Luterana de Diaconia (FLD) em parceria com a Itaipu Binacional, tem contribuído para o fortalecimento de técnicas agroecológicas e sustentáveis de produção e manejo animal nos territórios indígenas do oeste e litoral paranaense. 

À frente do acompanhamento técnico, a assessora de projetos da FLD e zootecnista Letícia Macedo faz visitas regulares para avaliar o desenvolvimento dos animais e oferecer orientações especializadas. O objetivo é garantir que as criações de porcos, aves e peixes que já existem nos tekoha prosperem de maneira sustentável, favorecendo a saúde dos animais e evitando doenças e mortalidade. 

Segundo Letícia, o trabalho envolve orientar as famílias sobre diversos temas, dentre os quais: alimentos que podem ser usados na nutrição animal, alimentos que são tóxicos e devem ser evitados, manejos reprodutivos, sanidade e uso de fitoterapia, cuidados com as instalações, manejo de pastagens, bem estar animal, dentre outros. Além das orientações e visitas técnicas, as comunidades também têm participado de oficinas com temáticas específicas. Até o momento, foram realizadas oficinas de castração e de produção de iscas para captura de abelhas sem ferrão. 

De acordo com Letícia, a relação do povo Guarani com os animais é muito respeitosa. “Eles têm preferência pela criação dos animais de maneira livre, não gostam de prendê-los em pequenos espaços, por isso temos buscado desenvolver instalações e sistemas que atendam a essas preferências, como galinheiros com piquetes e sistema integrado de criação de suínos ao ar livre”, afirma.  A zootecnista ainda comenta que, antes de qualquer abate ou uso de um recurso animal, muitas vezes, realizam-se orações ou pedidos de permissão aos espíritos da natureza. “A relação com esses animais é permeada por um senso de reciprocidade e equilíbrio. Uma visão que se opõe ao uso predatório ou industrializado dos animais, buscando sempre um convívio respeitoso”, conta.  

Meliponicultura e o cuidado com as abelhas nativas

A criação de abelhas nativas sem ferrão também integra as ações do projeto OPANÁ. Na perspectiva do projeto, as abelhas nativas são fundamentais não apenas para a produção de mel, própolis e pólen, mas também para a preservação ambiental, visto que são importantes polinizadoras que garantem a manutenção da biodiversidade na natureza.

O mel ocupa um lugar de destaque na cultura Guarani, tanto pela sua função medicinal quanto pelo seu uso dentro de práticas tradicionais. Silviane Acosta, do Tekoha Mokoi Joegua, em Santa Helena (PR), explica que, na visão Guarani, o mel de jataí é considerado um remédio natural, geralmente utilizado em combinação com ervas e outros preparados naturais. Seu uso, no entanto, segue critérios específicos, sendo recomendado pela liderança espiritual de acordo com a necessidade de cada pessoa. “O mel é muito utilizado para tosse e resfriados das crianças, mas seu uso também carrega um significado que vai além do medicinal. Nem sempre os remédios não indígenas funcionam para nós Guarani. É preciso, primeiro, que o líder espiritual peça a Nhanderu autorização para usar aquela medicina”, comenta Silviane, destacando o cuidado com as abelhas como parte do fortalecimento da espiritualidade.

Carmelo Acosta, também morador do Tekoha Mokoi Joegua, destaca que o cuidado com as abelhas nativas é uma prática antiga na tradição indígena, mas muitos conhecimentos ancestrais acabaram se perdendo com o tempo. “Sempre cuidamos das abelhas, mas algumas coisas foram ficando para trás. Agora, queremos trazer esse conhecimento de volta e fortalecer o que ainda temos”, afirma.

Através do projeto OPANÁ, o objetivo é não apenas preservar as espécies de abelhas que já estão presentes nos tekoha, mas também resgatar outras espécies que se tornaram mais raras. Ainda neste ano terá início a implantação de mais meliponários nos territórios participantes da ação, com previsão de formação de 460 colmeias.

Piscicultura e segurança alimentar

Nos tekoha, a piscicultura em tanques elevados também tem recebido atenção. A assessora de projetos da FLD e engenheira de aquicultura Micheli Becker, responsável por esse acompanhamento, destaca a relação entre o povo Guarani e os peixes. “Culturalmente, o peixe sempre fez parte da vida Guarani. Muitos se lembram com saudade da infância, quando se banhavam nos rios e de lá tiravam o alimento. Hoje, com a contaminação das águas, essas práticas estão se perdendo. O projeto busca resgatar e fortalecer esse vínculo que sempre existiu”, explica.

Micheli ressalta o cuidado e o respeito que o povo Guarani tem pelos peixes, enfatizando que os momentos de despesca são verdadeiras celebrações, envolvendo toda a comunidade, e em especial as crianças. “Na cultura Guarani, há um profundo respeito pelos animais, especialmente pelos filhotes, que só são utilizados para a alimentação quando já atingiram sua fase adulta”, acrescenta. 

Atualmente, o projeto acompanha e auxilia na manutenção de sete tanques de peixes existentes nas comunidades. A previsão é a instalação de 31 novas unidades ao longo da iniciativa, com objetivo de ampliar a segurança alimentar e a autonomia das comunidades Guarani.